Estampa criada a partir de fotografia tirada dos edifícios antigos do centro do Rio de Janeiro. |
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- Uma crônica sobre o amor (e a necessidade) por estampas. -
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A verdade, Matilde, é que eu cresci, tornei-me adulta, mas meus olhos enxergam o mundo como se eu fosse ainda criança. Aquele pôr do sol que invade a sala pintando tudo de vermelho, é quase igual todos os dias, mas todos os dias me parece um sol diferente. Certeza que as nuvens não formam os mesmos desenhos no céu. Certeza que o tom de lilás não é o mesmo de sábado passado, inclusive, como é difícil captar na lente, aquele tom de lilás! Certeza que eu tropeço em todas as calçadas e esbarro nas pessoas, não por maldade, mas por que ando olhando pros contornos dos prédios que criam molduras diversas para um céu azul. Olho pra cima, Matilde. Olho pros lados, olho pra tudo e me surpreendo diariamente, sem estafa.
O mundo, Matilde, é uma tela preenchida em constante movimento. Ela passa despercebia aos olhos da maioria das pessoas que, ensimesmadas, apressadas, estressadas, enlouquecidas, esquecem que os olhos servem para enxergar além do sinal vermelho do trânsito.
Acontece que todos os dias me surpreendo com a beleza do edifício espelhado que tem aqui na esquina da rua, por que todos os dias aqueles espelhos refletem uma paleta de azul diferente. E me angustia ver o mundo com esses olhos e não me apropriar dele.
O que me motiva, Matilde, é a beleza. Tudo o que é belo me atrai ao ponto de eu desejar captar, manipular, converter, moldar aquela beleza e me cobrir dela. Materializar tudo o que eu não posso levar comigo, me parece um plano ambicioso, mas não é de ambição que são feitos os sonhos? Será que os outros veem as mesmas coisas que eu? E, se não veem, será que eu posso colocar essa beleza na vitrine do mundo, fustigando incansavelmente o olhar alheio? Acho que sim.
As ruas, os prédios, o azul do céu, o reflexo na água, a árvore, a neblina, são coisas que entram em mim, mas não me pertencem. Ficam ali, guardadas no campo da intangibilidade, transformadas em sentidos fáceis de esquecer. E é aí que eu entro em ação, Matilde. É aí que eu fotografo tudo e começo a montar um quebra-cabeças de encaixe perfeito, que vai cobrir o meu, o seu corpo, com o que o mundo tem de mais bonito.
É aí, Matilde, que as ruas, os prédios, o azul do céu, o reflexo na água, a árvore, a neblina, viram estampa dos metros de tecido que cobrem todos os espaços livres da minha sala. É como se eu condensasse isso tudo num metro quadrado fluido e palpável. O que eu faço, Matilde, é usar o mundo como moldura do que eu sou. E esse mundo de fora para dentro, me transborda.
Eu percebo, Matilde, que sou um pontinho minúsculo na paisagem, que sou engolida diariamente pela infinitude do futuro. Sinto-me sem fôlego diante da imensidão de cores e formas que a natureza e o homem produzem e, de vez em quando, me pego melancólica por pensar que um dia não verei mais esse quadro. O nosso quadro. O quadro de todos, suspenso nessa grande sala mal decorada, que é a vida.
Pensa comigo, Matilde: nossa saída não vai ser triunfal. Vai ser silenciosa e pacata. O prédio espelhado vai continuar aqui na esquina da rua, mas eu e você não. O azul do céu ainda vai ser azul, a água vai refletir da mesma forma, a neblina vai continuar roubando os contornos da cidade, mas eu, Matilde, já terei captado tudo o que posso, já terei exaurido os olhos e levado os sentidos ao cansaço, já terei me vestido com todas as flores, todos os morros, todos os prédios, todos os mares.
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Carol Burgo
Quando leio seus textos te admiro ainda mais, vc deve receber milhares de elogios todos os dias, vc é criativa, inteligente, animada, cheia de vida, amo suas fotos de paisagens, imagino o quanto deve ser bom ter vc como amiga, irmã e/ou filha... conviver com alguém tão fascinante ... Parabéns e muito sucesso sempre porque vc merece...
ResponderEliminarLuciana Campo Grande
Carol, você é massa de mais!
ResponderEliminarVocê uma artista!
Adoro como você se veste mais gosto mais de como você escreve. Essa tinta que lava a tua alma me encanta!
Ai que maravilhosa!
ResponderEliminarA gente tinha que ser amiga, menina. Pra dividir as poesias da vida, sua poesia colorida de Rio de Janeiro, minha poesia cinza de São Paulo e todas as poesias de se existir onde quer que seja.
Caralhoooo
ResponderEliminarProfundo!
ResponderEliminartexto maravilhoso. Sútil e profundo.
ResponderEliminarAi gente, como eu queria ter a Carol como amiga, ela é uma linda! <3 Queria ter a criatividade que ela tem! A admiração é tanta que fiz até post no meu blog sobre ela http://simsemfrescura.blogspot.com.br/2014/04/pela-web.html
ResponderEliminarLindo texto!
ResponderEliminarIsso q e texto!! Parabens Carol por ter tamanha sensibilidade p captar o q passa desapercebido p a maioria. E dps ainda usa essa criatividade q transborda em vc para criar estampas LINDAS e INIGUALAVEIS!! Sou sua fa! Bjs
ResponderEliminarLindo, Carol.
ResponderEliminarLindo, Carol.
ResponderEliminarQuem nasce com olhos de artista enxerga diferente de quem não nasceu assim. Pode ser sorte ou azar. É a diferença entre talento e vocação.
ResponderEliminarLindo... me identifiquei tanto...a fotografia é uma das minhas formas preferidas de captar tudo isso que eu também sinto ao enxergar o mundo que me cerca. Aos poucos foi se tornando praticamente um vício, uma necessidade. Realmente é uma maneira que a gente tem de tentar capturar a própria vida que nos escapa entre os dedos constantemente. Sentir-se parte também, muitas vezes conseguindo expressar e mostrar para os outros uma beleza que às vezes só a gente tinha conseguido enxergar. É mágico. :)
ResponderEliminarÉ, Matilde, eu também esbarro em tudo e em todos porque como a Carol, também ando na rua olhando para cima, para os lados e para tudo à minha volta. É impressionante, Matilde, como esse olhar faz faz tudo ficar mais belo, o dia-a-dia mais colorido e com mais graça. Se todo mundo pudesse ter essa percepção, todos teríamos um lugar melhor para viver.
ResponderEliminarE aprendamos a olhar para baixo também: É ali que temos o desenho das ruas, as flores dos canteiros, as crianças, os cachorrinhos... E vemos também quem sofre, Matilde.... E são muitos... Que precisam de nossa mão. E se a dermos, vamos também mudar o mundo, mudar o NOSSO mundo....
A beleza está em tudo, Matilde e Carol, e, Graças a Deus, sabemos encontrá-la nos mínimos detalhes!!
AMEI SEU TEXTO!! Aliás, sinceramente, amo muito mais seus textos do que propriamente o look do dia ;-)))) Bjão!
Acredito tanto em vc, Carol. Você é o que um verdadeiro artista tem que ser. Ele mesmo. Sem ter medo de aparecer e transparecer. Nunca te considerei uma blogueira, mas sim uma artista. E como a leitora acima, não venho atrás dos looks, e sempre te segui pra "curiar" o que vc está inventando no momento, um desenho lindo, uma estampa ou um texto... Parabéns querida e obrigada por dividir sempre com a gente. Um beijo
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