Memória Afetiva

23 agosto 2014
Afirmo, mas sem arrogância no coração, que ter sido criada em Portugal me proporcionou experiências gastronômicas incríveis. Eu sei, o Brasil e principalmente o nordeste, é lugar de comida maravilhosa, mas como não fui criada aqui, meu paladar curte outras coisinhas às quais não tenho tanto acesso em terras tupiniquis. Bacalhau bom, com certeza, mas o que eu mais sinto falta da terrinha são os queijos maravilhosos. Amo queijo com gosto forte, mas nem só de gorgonzola vive o homem né? Por isso sinto falta dos queijos de cabra portugueses e, nas minhas andanças de supermercado, acabei encontrando um queijo quase igual ao meu preferido de infância. Se isso não é amor, é cilada, Bino.



Lá em Portugal esse é o super tradicional queijo saloio. "Saloio" é a palavra usada para designar tudo o que deriva da zona rural portuguesa e é uma palavra muito familiar para mim, por que eu passei minha infância na zona rural, com amiguinhos que tinham pais lavradores, dirigiam tratores e, antes dos 12 anos já sabiam manejar uma espingarda, pra sair à caça com os pais. Sim, acreditem, não é invenção minha, eu cresci num lugar assim, com bastante mato e ovelhas. E foi ótimo, por que minha infância foi super tranquila e os grandes eventos da aldeia (em Portugal esses lugares rurais chamam-se aldeias) eram os bailinhos de carnaval, as apresentações de Rancho Folclórico ou o dia em que aquele meu amigo Cláudio ganhou uma vaca chamada Estrela.



Home Sweet Home até meus 15 anos

Dá pra imaginar que um dia eu tenha morado num lugar assim? Lembro que a aldeia onde cresci, chamada Magoito, é uma zona rural perto da praia, uma praia espetacular inclusive, e o mais interessante é a mistura de estilos de vida: os mesmos amigos que trabalhavam na terra no verão, saíam da plantação direto pra praia, com a prancha de surf embaixo do braço. Esses mesmos meninos cuidavam dos animais no quintal de casa e depois disparavam em grupos de motocross por dentro dos pinhais e das serras. Que coisa tão doida e tão interessante.

É impossível uma vivência dessa não ficar arraigada num ser humano e o paladar é parte fundamental da memória afetiva que eu tenho de Portugal. Por isso tenho um amor maior pelas comidas de lá e é aqui que retornamos ao assunto do queijo de cabra. Essa iguaria custa MUITO caro no Brasil. Quando encontrei o bendito queijo de cabra curado no Pão de Açúcar e vi o preço, tive vontade de chorar: R$ 35 por duas bolinhas dessas. Mas eu não resisti. Comprei o queijo e trouxe para casa como se fosse meu coração na mão. E fui imensamente feliz, ainda que por poucos minutos, de tomar um café da manhã com gostinho de infância. Me trouxe à memória tantas coisas boas, que R$ 35 foi pouco.

O queijo de cabra tem um gosto peculiar, cheio de personalidade, que eu amo. Não é queijo que só tem gosto de sal, como o prato (que é péssimo, por sinal), é um gosto de leite mesmo. Melhor coisa do mundo. E junto com um fiozinho de mel, fica perfeito. Eu sei que nem todo mundo vai ter esse saudosismo comendo um queijo de cabra e sei também que pode ser pura frescura de um coração sensível, mas acreditem, é amor em forma de comida. :)

E vocês, tem alguma comida que é gostinho de infância?

Beijos, Carols
11 comentários on "Memória Afetiva"
  1. carolina.23.8.14

    comida com gosto de infância: macarrão só com manteiga + ovo frito + tomate em rodelas. amo! #rhyca #luxo #ostentação #sóquenão.

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  2. Paula Batista23.8.14

    Que lindo Carol, se achar vou comprar pois vc detalhou tanto o sabor que fiquei curiosa! Minha mãe comprava pra mim era queijinho de trança, ficava um tempão desfiando e comendo! Bons tempos...

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  3. Anna Beatriz Lorenzo23.8.14

    Que delicia deve ter sido a sua infância! E que curioso descobrir que essa mulher tão criativa, moderna e espontânea tenha crescido numa aldeia rural! Certamente esses pequenos detalhes que remetem as nossas melhores memórias são uma grande alegria... Passo por aqui sempre e, depois de descobrir que você estará mais presente no blog, já coloquei ele no meus feeds! Beijos!

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  4. Cássia Farias23.8.14

    Não achei que fosse possível me apaixonar ainda mais pelo seu blog, Carol! Permita me dizer que mesmo que você escrevesse em um blog de pescaria, eu ainda leria. Adoro que você é uma pessoa que põe seu coração em tudo que faz.

    Um beijo!

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  5. Rebecca23.8.14

    Pizza p mim tem sabor d infancia! Pode ser uma coisa banal, mas era qnd a minha familia se reunia todo domingo a espera dela...haha

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  6. Mariana25.8.14

    Carol, adoro seu blog, seus looks, seus livros e seus posts!

    Moro no interior do Estado de SP e minha infância, por incrível que pareça, foi bem parecida com a que você descreveu. Só não tinha mar por aqui!
    Mas tbm tive uma vaca chamada Estrela! :) hehe

    Adoro coisas com gosto de infância, e uma delas é o leite integral direto do sítio!

    beijos!

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  7. Na gastronomia isso tem um nome "Comfort Food" todas aquelas comidas que nos trazem lembranças do passado e aguçam a nossa memória afetiva, podem ser consideradas de comfort. Adorei o post, mt amor em pucos parágrafos. Bjao

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  8. Tayná Saes25.8.14

    Carol, vou começar pelos elogios: esses teus posts falando sobre outros assuntos estão excelentes. E as fotos estão cada vez mais legais. Parabéns!
    Nunca comi queijo de cabra, mas sempre ouço falar bem. AMO queijo com mel. Uma vez comi um queijo uruguaio, com gosto beeeeem forte, bem marcante mesmo, e mel por cima. Di-vi-no! Por isso entendo perfeitamente quando você fala de amor em forma de comida.
    Brócolis (AMO) lembra muito minha infância. rs Enquanto minha mãe ia cozinhando e colocando na bacia para escorrer, eu ia comendo as "arvorezinhas" e as folhas gigantes, sem sal e nem nada. Nostalgia mode on. rs

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  9. Rafaella Lacerda26.8.14

    Gente do céu, sem exagero nenhum, tá pra nascer um blog mais tudo de bom que o seu, Carol. Não perco um post! Você sabe fazer disso aqui um negócio diferente de tudo que tem por aí. Aqui eu encontro inspiração, beleza, criatividade, personalidade, sensibilidade... Não costumo ler textos de "look do dia" por ex. (sempre uma chatice, quando existem, claro) mas os teus eu sempre leio, por algum motivo eu sei que quase sempre tem algo de divertido/pessoal/etc neles, e sempre tenho a impressão que te conheço a muito tempo... quem dirá nos demais textos, essa sensação de pessoalidade (existe isso? kkk) é ainda maior. Enfim, não sou tão boa com as palavras quanto você e o recado é pra ser rápido mesmo. Adoro teu trabalho, beijos mil!!

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  10. Karina26.8.14

    Guria, eu já tinha gostado de ler o teu blog pelos posts de Cartagena. Mas ao ler as tuas memórias afetivas, sinto que definitivamente me emocionei. Com as tuas palavras, com a tua sensibilidade, com a tua experiência. Minha família é portuguesa, mas apenas meus pais e dois tios com suas respectivas famílias vivem cá; cresci com os meus avós, portugueses, e com todos os hábitos que uma família portuguesa com certeza pode ter. Incorporei tudo isso na minha personalidade de forma tão profunda, que me sinto mais eu quando tenho contato com tudo o que é Portugal e me estimula memórias afetivas tão parecidas com as tuas.
    Estive na terrinha no mês passado e desde que voltei estou obcecada por encontrar sabores lusitanos em Porto Alegre, porque, como disseste, o sabor é um pedaço dos nossos corações. Entretanto, o bacalhau bom é raro, o vinho bom é absurdamente caro, o pão é uma piada e o queijo de cabra, ah... já tinha perdido as esperanças! Até encontrei uma bolinha aqui, de um queijo que nem tenho certeza de onde era (acho que da região de Sintra) e que custava a bagatela de R$ 170,00!!! Inacreditável.
    Fiquei muito feliz em saber que há esperanças no Rio (e não é de se admirar que tenhas encontrado a iguaria no Pão de Açúcar, corporação presidida por um português) e que há alguém que, não muito distante, está em snitonia com o que eu penso e sinto. Obrigada, flor!
    Segue escrevendo e inspirando assim, "sem caber de imaginar"!
    Beijo grande!

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  11. priscilla27.8.14

    tenho que dizer que sempre fico muito feliz quando voce escreve sobre portugal. meu pai e toda a familia dele sao do norte de la, de vila nova de gaia e eu tive a oportunidade de morar em lisboa por quase 2anos ha uns anos atras. e mesmo nao tendo sido criada por la, posso dizer que compartilho do mesmo saudosismo, pois a cultura portuguesa la em casa sempre foi muito forte! nao sei se to sensivel hoje ou o que, mas confesso que ler esse post me deixou um pouquinho emocionada. :)

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